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Poemas da escritora Paula Vaz

Fulgor

Esses caçadores do sublime
de onde falam
já não podem voltar

É sempre de uma explosão
que se trata

A natureza animal
assombrada
o gesto afetado
a voz rouca
que fala

O mais etéreo dos perfumes
comovendo
os corpos

Nunca se sabe
– como diria Keith-
o Richards
se terás um orgasmo
ou um infarto

O objeto é a pesquisa

Onde era a verdade
vertigem
Harmonia
Ultraje

Fiar a vida
com fogo ardente
Versar com ela
como um artesão
tocando a matéria

Porque apesar de
Fica o que resiste
do vivo da alegria

do florescer da quaresmeira
tão real quanto breve

Notável e soberano

Disso nascem as flores
amores
as dores e os poemas


Tartaruga

Não é que a Tartaruga
goste de mundo
quase parando.

É que ela tem a saúde
de não perceber
que da concha que se move
não há quem alcance o passo.

Nem Aquiles nem a Lebre.

Que passem à frente dela
todos os apressados.

E recolham da paixão
suas mãos ávidas.

Mas que ao final
todos cheguem ao seu destino

de carta

que faz do endereço extraviado a própria casa


A coruja

Com olho arregalado 
ela emudece
vendo a noite do mundo.

Ela não consegue dormir 
nem falar de amor

Um poeta diria que é porque amor
é feito bomba
nas mãos pode explodir

mas a coruja não tem mão
e impenetrável permanece

É por isso que ela é muda?

Devo pesquisar os modos da coruja
antes que isso termine
e eu conclua a coruja
sem a coruja

Ah, sim,
Lá está ela
Do alto da sua Árvore
ou no chão da estrada
noturna e muda

Mas às vezes ela muda 
Ela grita?

Parece gato com asa
empalhado
e desidratado

O que reidrata a coruja?

She likes the night light, baby!
She likes the night light


O saber do sabão

Era preciso lavar
o saber antigo
os modos de vida consagrados

Era preciso encontrar
uma outra maneira
de rolar o rochedo de sísifo

porque empurrar o rochedo até o cume
e vê-lo descer morro abaixo
torna a vida muito cansativa

Era preciso tocar o mundo
sem as mãos e, ainda assim, recriá-lo
para que ele deixe de ser um museu
de velhas novidades

porque do alto da montanha
como dizia Ponge
pode haver sim
um outro horizonte
que nos conduza a uma outra versão

Menos moralismo, mais liberdade
menos autoritarismo, mais umidade

“SENHORES E SENHORAS A ILUMINAÇÃO É OBLÍQUA”

As leis do ser hão de brotar
à margem de todo pessimismo
a despeito da falta de sentido do mundo
apesar de nós

O saber do sabão
extraído da operação de higiene intelectual
faz cair em ruína toda eloquência
e subir em surdina
pequenas bolhas de luz
que transmutadas
vão ocupando pouco a pouco
seus espaços no ar
em reflexos multicores que se espalham nos céus


O ramo é o anagrama do amor.
Onde não se diz do amor:
o ramo, a flor, algumas folhas

Onde tem amor
tem Amora
Amora da mata
Rosália
amoral

Onde tem amora-vermelha
amor-crescido
amorenado
amorepixuna
amores

Onde tem amores
amores-de-negro
espinho de carneiro
amores-do-campo-sujo
amurado

Amor-febril
a pé
a pata
amorfa

Onde tem amor
amor perfeito bravo
amor perfeito da china
amor perfeito do mato

Onde tem amor
no dorso viridário da paisagem
amor tecer
porque amor tecido
um dia
ainda será poesia

pv2

ESPAÇO ARTELETRA: A POESIA DA PSICÓLOGA MINEIRA PAULA VAZ

A ONÇA

Esses animais melânicos
já sofreram mutações

Por isso surgem na luz
como vestígios da noite

E esse poder muscular
de rasgar o vento
divide ao meio uma floresta

A TARTARUGA

As tartarugas como as cartas
sempre chegam ao seu destino

A ANTA

A anta é um mamífero
mas poderia ser uma pilastra irremovível

A GALINHA

O voo da galinha é um fogo de palha

O LABRADOR

O dilema é claro
se ele se comprime
perde a própria
natureza
se ele se exprime
estraga um pouco 
seu jardim

porque o real
derrama

E se mergulha para valer nas águas
é porque sabe nadar. 

E não venham lhe pedir remanso
ou explicar-lhe com palavras de Paul Ricoeur
que nunca sairemos saciados da vida
já que sempre deixaremos
um banquete para trás

O labrador não tem pachorra

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DESERTO

E o deserto é uma página em branco
Esse espaço desabitado
A mudez das coisas que perdem
os seus nomes
Essas terras da sede
Esse território negligente
coberto de escombros
Altar rodeado de velas

Sagrada inquietude
de tudo que ainda não é
silêncio

Todo livro é um deserto
porque a princípio
não temos palavras para intensidades
e só interessa escrever
sobre aquilo que não temos
palavras para dizer

Então é preciso pescá-las
pelo mundo
engendrá-las
até sentirmos que conseguimos passar
o elefante da solidão
pelo buraco de uma agulha

Escrever é encontrar o fio
do buraco da nossa agulha
onde quer que ele esteja
no horizonte
nas bordas do mar 
perto de você

É esse escrito que ofereço
às palavras que nos transbordam
às palavras que nos transportam
aos livros que precipitam livros
aos Contos de amor e Não

Porque O amor não vazará meus olhos
Nunca mais

Escrever é retornar à sala vazia
à copa de uma árvore
e escutar o que vive

É não estar de acordo com as coisas
como são
É querer modificá-las um pouco
e não saber o que virá

Essa moral de ser
em direção ao fulgor
Como diria Duras
escrever em direção aos desertos
porque somos todos instruídos em dor

Sem sombra
Partidos

Para cada deserto é preciso um artifício
que expresse a língua
da sua natureza muda.

O deserto era a página em branco.                                      

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TEU POEMA

Cada poeta que descubro
me apaga inteira

Interrompo a leitura

Teu poema me assola e me afunda

Quero palmilhar o ritmo 
da sua respiração

Sinto que não escrevi nada ainda

Cirúrgica
num mesmo ato
sua letra me ara e me desterra

Torço para que se demore em minhas mãos
e tento me prevenir do que virá

Mas o que vem me espera
em xeque- mate

Agasalho-me frente ao teu poema
mas ele me despe

Nossas palavras se encontram na sua linha 
e no meu silêncio

Nossas palavras se veem 
antes que nos vejamos 

Elas não sabem o que fazer 
com o que viram

Elas se reviram
por dentro

Minhas palavras querem fazer algo 
com as suas

Elas não sabem o quê

Fecho teu livro

O que for acordará.    

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CORAÇÃO

Meu coração é um mundo à parte
Uma gaiola entreaberta
Um museu de brinquedos
Uma chuva fina
contínua
Um lodo
Um filme De Fellini
Um filme de Godard
Pássaro que gralha
Criança com as mãos no ouvido

********************

A OUTRA LÍNGUA: AMOR

O amor é uma vibração da língua
quando tiramos o sentido das coisas
Gesto que chega como uma palavra nova
O amor é um abismo e a linguagem
o muro que não consegue explicá-lo

Alguém diria : é  quase música

O  que  nos resta então
senão tomarmos o partido da voz
ouvirmos o ruído do silêncio das conchas
deixar que o nome próprio penetre
na mundaneidade das coisas
co-nascer com elas
a cada olhar que as percebe
por uma escritura um gesto
um tom um som

Ser um instrumento de corda
para que o mundo soe e  ressoe

Porque o som
esse que sai do fundo da garganta dos homens
esse som mudo e, no entanto, imperativo,
custa a achar um espaço propício
por onde possa falar.
E, quando fala, já não fala mais,
canta.
Porque toda caixa de ressonância
é motivo de música.

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A ESPONJA

Essa mania de se deixar inundar pelas águas,
consentir com a expansão,
e depois esse desejo de reclusão ao pouco,
essa vontade de voltar para casa,
retornar ao centro. O seco.

E pensar que nada disso é sempre suave,
esse ir e vir.
Ir e abandonar as formas,
vir e abandonar as águas.

Todo esse processo vivo de sístole e diástole:
corpo vivo que não se cala, a não ser no risco.

Corpo tornado linha,
tornado margem.

Apesar do tufão, agora é como se sorrisse por dentro,
com entusiasmo, mas sem alarde.

Até que batam à porta,
até que lhe voltem a retumbar, no imo,
os empuxos do mundo.

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CRISTAL NATURAL

Penso  em você como quem mói a carne naquele aparelho antigo e enferrujado atarraxado a mesa.

O triturador cumpre o seu destino.

Há séculos soturnos que separam nossas línguas.

Entre nós, tanto muro, tanto tijolo

e essa lã misturada a vidro  que recheia  a parede  das casas pré-fabricadas.

A hora pára. Não o conheço mais.

Tateio apenas as plantas, a relva, os artistas, os loucos e todos aqueles seres  vagalumes, que ainda têm claridades.

E rogo ao horizonte das aves que sobrevoam o mar a concessão de plainar sobre a superfície das águas

até que se revele a mim o que fazer com esse  açúcar União deixado aqui.

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ÉRAMOS

Alguém disse:
Eu te espero e esperarei sempre.
Ela joga as palavras atrás do sofá,
mas elas voltam para a beirada da cama.

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BELO HORIZONTE    

                                                           PÓS DRUMMOND

Não nasci em Itabira
Sou de Belo Horizonte                                                               
Por isso sou alegre e triste
contida e desmedida
Quarenta por cento de ferro nas artérias
Sessenta por cento  praça da liberdade
E esse estranhamento do que na vida é sede de ilusão
A vontade de amar que me anima e  arruína
vem de Belô
dessas montanhas que tramam e entranham
sua borda infinita evocando o mar
De BH trago este poema que te ofereço
Esse broche de lagartixa que era da minha avó
histórias do Fernando Sabino
e dos cavaleiros do apocalipse
o chaveiro da Itacolomi
a memória da Angela Lago
e um raminho desses ipês
que tomam conta dessa cidade-jardim
Tive ouro tive cobiças tive enganos
Hoje sou poeta
Sim meu amor
É belo o horizonte
Apesar dos pesares
do medo da morte
do medo da vida 
É belo o horizonte                                           

**********************************

A flor

A flor é a causa, o cálice que aspira a coisa,

pelo perfume que emana, as pétalas que soltam e a
insistência de viver suspensa ao chão.

Uma flor precisa de espaço para crescer,
e de determinada temperatura.

Algumas preferem o sol, outras se dão melhor
na sombra,

mais ainda existe aquela que necessita de meio dia
de sol e meio dia de sombra, como as lavandas.

Uma flor precisa de água.

Sem isso, seco o caule, não realiza sua beleza.

Ela deixa que o líquido escorra sobre seu corpo, filtrando
dela o frescor, mas em contrapartida, dele absorve o traço,
que lhe garante o desenho e a cor.

Autobiografia da autora

Nasci em Belo Horizonte, em 1973. Quando nova, eu queria ser jornalista ou estilista. Depois, resolvi que queria ser psicanalista. Formei-me em psicologia em 1996, mas, desde o começo do curso, já frequentava os eventos e as atividades nas instituições de psicanálise  Fiz parte da Escola Freudiana de Psicanálise por 6 anos. Fiz análise por 16 anos com analistas lacanianos. Trabalhei no ambulatório do Hemominas a convite da professora Lúcia Nunes por 3 anos e depois no CTI do Hospital Mater Dei por 6 anos a convite da Dra. Marisa Decat. Trabalho também no consultório desde então.

As letras sempre estiveram presentes, nos livros de poesia que ganhava do meu pai Javert, psiquiatra e estudioso de filosofia; nos muitos livros de psicanálise que minha mãe Gilda escrevia; nas oficinas da Dagmar Braga, nas aulas da escritora Lucia Castello Branco que eu frequentava como ouvinte na  Pós- graduação em literatura da UFMG sobre Maria Gabriela Llansol, Clarice Lispector, Marguerite Duras, Roland Barthes; nos encontros semanais na casa da Imaculada, coordenados pelo poeta Sérgio Alcides, onde líamos, a cada semestre ou ano, um poeta diferente, passando por Cecília Meireles, Ted Hughes, Drummond, Manuel Bandeira, Kaváfis, Armando Freitas Filho, Ana cristina César, Paul Valery, Wislawa Szymboska, Maiakóvsky e onde meus olhos se abriam cada vez mais encantados para esse universo; nas leituras de  Shakeaspere na casa da escritora Angela Lago, que também duraram 10 anos e que se transformaram em encontros em que discutíamos assuntos gerais da literatura e celebrávamos a vida e a amizade. Encontros que duraram até a partida da Angela, que me chamava de filha.

Em 2014, lancei meu primeiro livro Não se sai de árvore por meios de árvore, fruto do meu deslumbramento com a obra do poeta Francis Ponge e do impacto que ele teve sobre mim. Um encontro com todo um pensamento que eu abrigava informulado e que, ali, reconheci. Em 2016, lancei meu segundo livro A outra língua: amor e, em 2018, lancei Deserto, um livro necessário, escrito em uma madrugada, após releitura de três livros da escritora Lúcia Castello Branco. Livro que, quando acabei de escrever, já havia me transformado em outra pessoa. O ar era outro.

Todos os livros foram editados pela Cas’a Edições de Belo Horizonte, Minas Gerais.

Espaço ArteLetra

O Espaço ArteLetra é um ambiente de divulgação e circulação de produções artísticas e literárias, em particular de produções contemporâneas nacionais. Este Espaço de exposições tem como um dos principais objetivos apresentar projetos diversificados, incentivando a participação de novos artistas e contemplando diferentes suportes e linguagens, que tanto dizem da cena atual.

Uma das intenções do Espaço ArteLetra é aproximar o público de um amplo conjunto de obras, estimulando o acesso e consumo de arte. Ao trazer essas produções para o espaço privilegiado do Notícias Gerais, queremos suscitar novos diálogos e questões latentes da nossa sociedade, contribuindo para a formação de público e troca de experiências.

O palíndromo ArteLetra, formado pelo espelhamento quase perfeito das palavras “arte” e “letra”, apenas ressalta a característica híbrida das produções contemporâneas, e a estreita relação entre as artes, palavras e mídias. Esse laço é aqui uma representação das nossas relações, da maneira como nos correspondemos, e do reconhecimento de que as manifestações culturais nos tornam mais próximos, ainda que cada qual com seu olhar.

O Espaço ArteLetra mantém um calendário regular, sendo a cada semana um/a novo/a artista convidado/a.

Fique antenado!!!

Deborah Castro, curadora.

TECENDO ENCONTROS Live: PASSO POEMA

Passo Poema é um vídeo de arte que apresenta sete performances dançadas e inspiradas em poemas variados da poeta Paula Vaz e do poeta Pedro Muriel. Com a direção artística de Suely Machado, bailarinas e bailarinos do Primeiro Ato recorrem à arte da poesia para se aproximar das tantas sensações vividas com a situação de isolamento social devido à pandemia do COVID-19. Paula Vaz, uma das inspirações do vídeo, estará presente para conversar sobre seus poemas e as interfaces do feminino na sua profissão de psicanalista, no dia-a-dia, família, escrita…

Dobra de pensamento: O POETA É, AO MESMO TEMPO, AQUELE QUE ESCREVE E QUE É ESCRITO

Mesa 7: dia 25 de Julho, sábado | 19h (Brasil) | 21h (Cabo Verde) | 22h (Guiné-Bissau/São Tomé e Príncipe) | 23h (Portugal/Angola/Guiné Equatorial) | 00h (Espanha/Moçambique) | 06h⁺¹ (Macau) | 07h⁺¹ (Timor Leste)

Dobra de pensamento: O POETA É, AO MESMO TEMPO, AQUELE QUE ESCREVE E QUE É ESCRITO

Annita Costa Malufe (poeta, ensaísta e prof. universitária, Brasil)
Paula Vaz (poeta, psicanalista, Brasil)
Daniella Zupo (escritora, jornalista, Brasil)
Maurício Salles Vasconcelos (prof. universitário, escritor e ensaísta, Brasil)
Daniel Osiecki (poeta, editor, Brasil)

https://www.youtube.com/watch?v=nOeEYUTioQg

mallarmargens

Marcelo Ariel em Revista Mallarmargens

Ao adentrarmos nos livros da poeta e psicanalista Paula Vaz, um grande sim se inscreve nas copas de uma árvore de poemas que pensam e deslocam símbolos e sintagmas da obra de Francis Ponge e Paul Valéry para atravessá-los na direção de uma dicção e pulsação próprias. Em seu primeiro livro NÃO SE SAI DA ÁRVORE POR MEIOS DE ÁRVORE, PONGE-POESIA ( Cas’a Edições, 2014 ) , Paula chega a um hibridismo entre ensaio, poema e incorporação de uma poética em outra que a pensa em um processo que é velado na maioria dos poetas de hoje e assumido  por ela neste livro: o da escuta e notação como forças verbais, de composição do mundo. Em seu livro seguinte A OUTRA LÍNGUA: AMOR ( Cas’a Edições,2016) as demandas de organicidade destas forças ganham um endereço externo-interno : o corpo vivo e a duração do encontro enquanto acontecer da etérea leveza e porosidade  da experiência do existir. Paula continua seu hibridismo entre o poema e o ensaio mas em outra chave, ainda longe da metaforização crescente, um vício comum na poesia, desde sempre. As lições aprendidas com Ponge  em sua máquina de destruir metáforas, foram aprendidas com profundidade. Seu terceiro e mas recente livro DESERTO ( Cas’a Edições, 2018) ela chega ao que nos parece, o final de uma trilogia e de um processo que abarcam a experiência de transubstanciação da solidão em um pensamento onde a fuga poética é convertida em centro de um processo de apreensão do mundo. O deserto como todos sabemos, é o contrário da cidade e aqui a poética de Paula se bifurca entre aquilo que Benedito Nunes se referindo ao trabalho de Clarice Lispector  chamou uma vez de ‘   servir a ininteligibilidade das coisas’ e que em Paula é parte da adesão apaixonada ao Le Parti pris des choses de Francis Ponge e entre uma abordagem impressionista de um ex-centro que se move na direção das coisas em busca de um impacto que o dissolva e o converta em silêncio inicial do mundo. “  Marcelo Ariel em Revista Mallarmargens

SOBRE O LIVRO

O quarto livro de poemas de Paula Vaz é uma estudo sobre a animalidade do humano através de poemas que tentam dialogar em uma chave ao mesmo tempo existencialista e fabular com alguns animais, dialogando com um gênero dentro da tradição literária conhecido como zoopoética.


POEMA DO LIVRO ‘ O REINO ANIMAL DA POESIA’

A coruja

Com olho arregalado 
ela emudece
vendo a noite do mundo.

Ela não consegue dormir 
nem falar de amor

Um poeta diria que é porque amor
é feito bomba
nas mãos pode explodir

mas a coruja não tem mão
e impenetrável permanece

É por isso que ela é muda?

Devo pesquisar os modos da coruja
antes que isso termine
e eu conclua a coruja
sem a coruja

Ah, sim,
Lá está ela
Do alto da sua Árvore
ou no chão da estrada
noturna e muda

Mas às vezes ela muda 
Ela grita?

Parece gato com asa
empalhado
e desidratado

O que reidrata a coruja?

She likes the night light, baby!
She likes the night light

Não se sai de árvore por meio de árvore

Assunto: Lançamento de livro

Caros amigos,

Eis um livro, uma árvore…que habitou o espaço da Cas’a’screver e agora se abre para fora de si.

Leio assim esse livro: “tomar o partido das coisas = levar em consideração as palavras”. Leio com Paula Vaz, em conversa infinita com Frances Ponge, que
arvorecer demora…desloca-se entre a quimera de um dizer verdadeiro e a fulgurância do seu movimento. Arvorecer demora e, então, somos aspirados para o barro ou a lama do poema. Nesse lugar, os corpos, os telhados, a copa das árvores, o pensamento extenso, a língua, a palavra ofertada, são cristais cintilando no espaço de um silêncio tornado vivo.
Em nome de poeta, em nome de poema, recolhemos, ainda antes do amanhecer, o conhecimento vegetal que Paula nos oferece: Não se sai de árvores por meios de árvores.

Que o nome de poeta, nome de poema, continue arvorecendo nas mãos que sabem que a melhor medida é o rés, a matéria da palavra em estado de larva, o cristal do nome, sua medida vegetal, pedregulho mais brilhante do que o céu.

Arvorecer demora…celebremos, então…

Venham!

Abraços,

Janaina de Paula

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Paula Vaz lança livro “Deserto”

ESCRITORA PAULA VAZ LANÇA O LIVRO “DESERTO”, UM ROMANCE EM FORMA DE POEMA

AUTORA CONVIDA O LEITOR A ATRAVESSAR SEUS PRÓPRIOS DESERTOS NA NOVA OBRA

A escritora e psicanalista Paula Vaz acaba de lançar seu terceiro livro. Intitulada “Deserto” (C’asa edições), a publicação é um grande poema sobre os desertos que atravessam o ser humano, uma tentativa de costurar palavras e sentimentos que decodifiquem as tempestades e a aridez dessa travessia.

Paula buscou nos livros da escritora, ensaísta e acadêmica Lucia Castello Branco versos e expressões para desenhar seu mosaico. “É muito o que faço como leitora e como alguém que escreve. Faço falar as coisas, os autores que amo, e, por meio desse processo, faço falar a mim mesma”, elucida. Títulos como “Contos de Amor e Não”, “Nunca Mais” e “O Amor Não Vazará Meus Olhos” serviram como um grande dicionário para a escritora.

A obra teve a aval de Lucia Castello Branco. “As palavras não são minhas, são completamente suas”, foi o que Paula ouviu da escritora que, além de ser fio condutor, assina o posfácio do livro. Nele, Lucia traça o caminho percorrido por Paula em suas duas primeiras obras até desaguar em “Deserto”.

“Sou uma menina no areal. Não, não é o deserto ainda. São dunas, areias do mar. Olho para o mar com nostalgia, porque sei que vou perdê-lo. Ninguém me disse isso, mas eu sempre soube”. Este é um dos trechos que dá o tom da obra, escrita em apenas um dia e uma madrugada. “Foi um processo interessante porque toda experiência do deserto emudece. Deserto é justamente isso, a falta de palavras quando se depara com essa vastidão sem nome. E ao terminar de escrever, tive a sensação de que falei tudo o que precisava”, conta.

Um livro que pode, também, ser considerado um romance. Pequeno, mas intenso, ele faz parte da coleção “Livros Mínimos”, da Cas’a’screver. O processo contou com curadoria e edição de Janaina de Paula, e da arquiteta, tradutora e escritora Camila Morais. Os desenhos são de Julia Panadés, professora da Escola Guignard da Universidade do Estado de Minas Gerais, e o projeto gráfico é assinado por Fernanda Gontijo.


SOBRE A AUTORA:

Paula Vaz é psicanalista, escritora e poeta. Autora dos livros: “Não se sai de árvore por meios de árvore” e “A outra língua: o amor”.

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Escritora e psicanalista Paula Vaz lança o livro “A Outra Língua: Amor”

ESCRITORA PAULA VAZ LANÇA O LIVRO “A OUTRA LÍNGUA: AMOR” NA LIVRARIA SCRIPTUM, DIA 5 DE NOVEMBRO

PSICANALISTA DISCORRE SOBRE A LINGUAGEM DO AMOR

No dia 5 de novembro, às 11h30, a escritora e psicanalista Paula Vaz lança o livro A Outra Língua: Amor, na Livraria Scriptum. Publicada pela editora cas’a’screver, a obra tem desenhos da artista plástica Julia Panadés, projeto gráfico de Daniella Domingues, revisão de Alice Bedê e Mariza Labanca e edição de Janaina de Paula.

Em um tempo de liberdade desmedida, em que o homem tem opinião formada sobre tudo, as pessoas se comportam como jogadores de times rivais. No entanto, “usamos palavras demais, mas nunca parecemos tão mudos como as carpas e os pedregulhos”, comenta Paula Vaz. “Se as pessoas aceitam o outro somente na medida em que portam opiniões iguais, é sinal de que o mundo está se tornando cada vez mais intolerante com a diferença. E o que tudo isso tem a ver com o amor?”, pergunta. A conclusão da autora é que a linguagem comum, aquela em que as pessoas compartilham imediatamente o que lhes vem à mente na ilusão de poderem tudo dizer, esgotou-se.

É preciso outra língua. Não se pode ser ouvido em linguagem comum. Para a escritora só vale a pena escrever sobre aquilo que não se pode falar. “Se não podemos dizer, não é por pudor, mas por uma incapacidade estrutural da língua comum de expressar o que carregamos de mais singular em nós”, diz. E como sair do saco sem fundo das “palavras acostumadas”?

Para Paula Vaz, não se sai do homem por meios do homem, é preciso ser chacoalhado pelo amor. Apenas o amor se transmite. Isso vale para a psicanálise, para a poesia e para a vida.  “O amor aqui ganha amplidão. Não se trata dos relacionamentos. O amor é tratado na sua mais radical solidão. Um ser que ama o mundo é um ser que experimentou o gosto de assumir a sua diferença. Cada ser que um dia foi ouvido em sua singularidade, torna-se uma esperança. O amor é o poder de ouvir o outro além das próprias convicções. Escutar a singularidade de cada objeto, seja ele qual for, requer um imenso trabalho de esvaziar-se de si.”, comenta.

Amar é ser um instrumento de corda para a escritora, ou qualquer outro instrumento meio oco que permite ao outro e às coisas ouvirem a própria voz. “Os instrumentos de corda, as paredes de uma capela, os ecos que ouvimos se ousamos gritar numa floresta de pinheiros, as pessoas que passam por uma análise, os artistas que se ausentam de si para doar à obra (e ao mundo) o que lhes é mais sonoro, é disso que estamos falando. Porque o som, esse que sai do fundo da garganta dos homens, esse som mudo e, no entanto, imperativo, custa a achar uma via por onde possa sair e falar. E quando fala, ele já não fala mais, canta. Porque toda caixa de ressonância é motivo de música”, conclui. Nesse sentido, o amor talvez seja isso: “quase música”.


Paula Vaz é psicanalista, escritora e poeta. Autora do ensaio poético Não se sai de árvore por meios de árvore e de Ponge-Poesia.

SERVIÇO:

Lançamento do livro “Outra Língua: Amor”, de Paula Vaz
Data/horário: 5 de novembro, às 11h30.
Local: Livraria Scriptum (R. Fernandes Tourinho, 99 – Savassi)
Valor do livro: R$ 40,00